segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

TEXTOS III e IV - Baseados no livro Memórias D'África (Carlos Serrano, ec. Cortez)

III ÁFRICA E SUA INTERAÇÃO COM O MUNDO


A África é o berço da humanidade. Essa frase se justifica? Vejamos:

O homem de 6 milhões de anos
Fósseis do mais antigo ancestral humano são descobertos no Quênia e podem ser
a chave para chegar ao elo perdido entre homem e macaco. www.vejaonline.com.br


Por diversas causas o africano se movimentou pelo continente, e o que se encontra hoje são evidências de trocas culturais de milhares anos. Elementos das linguagens khoisan, fonemas e cliques, aparecem em idiomas bantu como o xhosa, zulu e shoto; grupos pigmeus adotaram idiomas bantu; orixás da área gbe foram incorporados aos rituais de yorubas e vice-versa... e muitas outras trocas culturais.


Assim também aconteceu para fora da África: grupos do Chifre africano cruzaram o deserto se mesclando com populações da península arábica.

Assim como povos árabes também se uniram à populações negras, originando, por exemplo, os abexins.

Trocas também sempre existiram na África isso porque o comércio possuía vários significados, não só o econômico. Nos mercados africanos se fortificava o sentimento de solidariedade e a consciência coletiva das comunidades. Um dos produtos mais trocados é a noz de cola (usada na Coca-Cola e na Pepsi), trazida pelos escravos para a América. Como ela é estimulante, se recorria à ela para atenuar a exaustão física. Na Umbanda e no Candomblé também é usada até hoje.


AFRICANOS CRUZARAM O ATLÂNTICO
Existem relatos de que o Império do Mali lançou duas gigantescas expedições no oceano Atlântico formadas por 2000 embarcações em direção à América. Mesmo que não tenham chegado lá, alvo de controvérsias, por si só ser capaz de organizar expedições desse tamanho demostra o poder e o talento desse Império.


Pelo oceano Índico os africanos se encontraram com indianos, árabes, chineses, indonesianos. A presença de correntes marítimas e atuação de massas de ar facilitaram esses contatos, aproximando povos e regiões, misturando culturas.

Esse contato entre a África e a Ásia muçulmana permitiu o surgimento dos swahili, organizada em cidades e fortalezas erguidas ao longo do litoral, deixou marcas profundas, a começar pelo kiswahili, a língua africana mais difundida pelo continente.



IV A IDENTIDADE DO CONTINENTE AFRICANO

A imagem da África foi construída ignorando as diversas etnias, línguas, religiões e culturas. Assim, existiriam apenas populações destinadas a ser sujeitadas, jamais compreendidas. O fato de a África ser um dos berços da escrita foi ignorado pelos europeus. Além dos hieróglifos egípcios, uma das primeiras escritas da humanidade, sistemas como meroídico, núbio antigo, copta, tifinagh (usado pelos tuaregues), ge’ez e bamun foram usados além de ideogramas inventados pelos ejagham.

                                 IDEOGRAMAS NSIDIBI, usado pelos ejagham
                                  HIERÓGLIFOS EGÍPCIOS

A oralidade, forma muito usada pelos africanos para transmitir seus conhecimentos através das gerações, foi entendida como sinal de analfabetismo. Os gritos, contadores de história africanos são responsáveis pelo repertório de contos, provérbios e relatos históricos, obtendo inclusive grande status social por possuírem tal conhecimento. Não é exagero dizer que muitos relatos foram perdidos no tempo.

Quanto à religião, aos olhos cristãos europeus, o africano praticava ritos pagãos e foram severamente perseguidos. Os europeus, reduzindo os africanos à condição de tribos sem identidade cultural, não distinguiam reinos, povos ou etnias. Por isso, na época da escravidão, os africanos raramente foram identificados pelo seu grupo cultural, mas pelos portos nos quais eram embarcados.

Ao norte da África predomina a língua e cultura árabes, principalmente pela expansão haussá no início do século XIX, tendo à frente uma liderança fula, Osman Dan Fodio; esse chefe guerreiro muçulmano controlou um império com centro na cidade de Sokoto, que acabou por influenciar muito além da Nigéria. As populações além do Saara são chamadas de Bilad-es-Sudan, ou seja, País dos Negros. Esse território que se estende do limite sul do deserto ao sul do continente africano pode ser caracterizado, apesar de abarcar tantos povos e culturas diferentes, por uma africanidade, ou seja, um conjunto de valores, posturas e formas de ver o mundo muito próprios:

 Sociedades comunitárias, que vivem pelo consenso e tradição;

 Usam o conceito de forças vitais (axé) encontradas nos reinos vegetal, animal e mineral e que estabelecem uma hierarquia com os humanos;

 Noção de ancestralidade, respeito à memória de familiares que morreram;

 Noção de família extensa, o africano vê a todos como seus irmãos, sendo de sangue ou não;

 Noção de que o poder é sagrado, e quem o possui não pode abusar dele, mas realiza-lo com sabedoria;

 Da não separação entre tempo e espaço, muito usado na modernidade, mas um conceito africano.

Com objetivo de justificar a escravidão, como se tudo já dito não bastasse, os europeus, através da ciência, classificaram os seres humanos em raças, o que não se justifica porque as diferenças existentes entre os seres humanos não permitem classifica-los em raças. Detalhes como cor da pele, tipo de cabelo, altura e formato dos olhos não são determinantes para definir um tronco racial. RAÇA é basicamente um conceito social, histórico e cultural. Biológico é que não é...

A identidade africana tem sido perseguida por diversos líderes atualmente numa tentativa de unir o continente e desenvolver seus países. Uma dessas tentativas chama-se UNIÃO AFRICANA, com 53 membros e muitos problemas para resolver. Como diz o escritor nigeriano Wole Soyinka, a África é um imenso continente, povoado por uma miríade (diversidade) de raças e culturas. Um dos principais problemas para união do continente é a grande variedade de línguas; acredita-se que 30,3% das línguas vivas no mundo, mais ou menos 2.092 línguas, estejam em uso no continente; outro agravante é a centena de religiões tradicionais, cada qual com conjunto de saberes; e a grande variedade de etnias.

É importante dizer que esses fatos podem ser obstáculos enormes, mas de fato não são, porque ainda assim, nada disso foi empecilho para que um africano se comunicasse com outro, porque algumas línguas são faladas por todo continente permitindo minimamente uma comunicação.

As diversas etnias também não são grande obstáculo à organização política, porque o poder político tradicional permitiu e foi capaz de criar mecanismos de solidariedade e convivência entre povos muito diferentes, trabalhando com consensos e mantendo interesses de manifestações culturais e religiosas. Por isso muitos impérios tradicionais africanos duraram mais que impérios europeus, como o Reino do Congo, que completava pelo menos 3 séculos de existência quando os portugueses chegaram em 1492; o Império de Ghana se prolongou por 9 séculos; o de Mali, por 3.




MACHREK e MAGREB
Machrek significa Ilha de Oriente, ou seja, países árabes na península e no que chamamos de Oriente Médio. Já o Magreb é a Ilha de Ocidente, Marrocos, Argélia e Tunísia.

MACHREK

MAGREB