Fonte:
OLIVEIRA, Luiz Fernandes de. Os Movimentos Sociais.
In: Sociologia para jovens do século XXI. OLIVEIRA, Luiz Fernandes de;
COSTA, Ricardo Cesar Rocha da (org.). RJ: Imperial Novo Milênio, 2007.
(p. 103-106)
Os Movimentos Sociais
Num recente artigo, o professor Solon Annes Viola (2003), da UNISINOS, descreve que:
Segundo
Kissinger, "a globalização é tão natural como a chuva". Por certo
Kissinger não conhece as múltiplas regiões do Brasil. No Nordeste
brasileiro chove pouco; no Sul, ao longo do inverno, as chuvas são
abundantes e ocorrem, no mínimo, duas enchentes por ano. E logo em
seguida faz as seguintes perguntas: Seria o Sul mais globalizado que o
Nordeste? O ciclo das chuvas regulado por grandes empresas, pelos
organismos financeiros internacionais como o G7, a OMC e o Banco
Mundial? O fato de que a quinta parte da gente mais rica do mundo
consumir 85% de todos os produtos e serviços, enquanto que a quinta
parte mais pobre consome somente 1/3% seria tão natural, quanto a chuva?
Seria tão natural que 4 bilhões e 400 milhões de habitantes dos países
mais pobres, aproximadamente três quintas partes da população mundial
não possuam acesso à água potável, uma quarta parte não possua moradia, e
uma quinta parte não tenha acesso a nenhum tipo de assistência médica?
Seria tão natural, como a chuva que 20% da população mundial consumam
86,5% das energias fósseis e hidráulicas do planeta? Seria possível que o
mesmo nível de consumo fosse colocado à disposição de todos sem que
houvesse um gigantesco desastre ambiental, tão terrível quanto a
prolongada seca, ou tão arrasador quanto as enxurradas das enchentes?
Seria tão natural quanto a chuva que americanos e europeus gastem 17
milhões de dólares em alimentos para animais por ano, 4 milhões de
dólares a mais do que se necessita para promover a alimentação e saúde
básica para os que não possuem? Seria tão natural como o sol que 300
milhões de crianças ocupem postos de trabalhos forçados e outras 37.000
morram diariamente de pobreza relacionada à subnutrição e à ingestão de
águas contaminadas e resíduos tóxicos?
Depois de perguntas
tão chocantes podemos também perguntar: será que não existe ninguém que
esteja fazendo algo contra estas barbaridades existentes no mundo? Sim,
existe, mas nem sempre essas pessoas que lutam contra este estado de
coisas são vistas com bons olhos.
Nos dias de hoje, ouve-se muito a respeito dos movimentos sociais.
A mídia está sempre noticiando a respeito deles, seja, Sem-Terra,
Greepeace ou as ONGs "Anti-globalização". Mas o que são movimentos
sociais? O que pretendem? Por que surgem em diversos momentos
históricos? Como são constituídos?
Os movimentos sociais estiveram e
estão presentes em toda a história de todas as sociedades. Temos que
compreendê-los como um fenômeno essencial, porque são resultados de um
"conflito" que gera, consequentemente, mudanças sociais. Ao mesmo tempo,
tais movimentos geram transformações porque sujeitos ou grupos que não
concordam com determinada situação procuram maneiras de modificá-la.
Nesse
sentido, o conflito é o elemento gerador dos movimentos sociais. E por
que se chega a estes conflitos? Simplesmesnte porque, [...], as
sociedades não são homogêneas e se dividem a partir de certos interesses
de classe, gênero, etnia, raça ou, até mesmo, de orientação sexual e de
geração. Há sempre grupos de opressores e oprimidos, gerando uma
carência de bens materiais e culturais a determinados grupos.
A
partir disto, certos grupos sociais, que se sintam prejudicados, ou
oprimidos de alguma forma, vão se unir a fim de eliminar ou, ao menos,
amenizar a opressão. A essa união chamamos de ações coletivas.
É
necessário saber que os movimentos sociais possuem uma relação de
conflito com o Estado, pois, como vimos, nem sempre este satisfaz a
vontade coletiva, se restringindo à vontade daqueles que dominam os
recursos materiais da sociedade e aos seus interesses.
Enquanto os
movimentos sociais desejam modificações, mudanças, o Estado, na maioria
das vezes, deseja manter a ordem das coisas ou, como dizem os
especialistas, o status quo.
Um movimento social só tem
força quando possui uma proposta, ou seja, os fins que almeja alcançar.
Por isso, há a necessidade de um projeto. A ideologia
também é um fator importante, já que reflete a visão de mundo dos
indivíduos que fazem este movimento, suas perspectivas, as mudanças que
ambicionam, o mundo que esperam.
Por fim, a organização é muito
importante, poque ela é a base do movimento, essencial para o seu
sucesso político. Afinal, sem instrumentos eficazes de comunicação e sem
recursos financeiros mínimos, os movimentos sociais acabariam
apresentando resultados mais limitados na sua ação política.
A cada
dia sempre surgem e surgirão mais movimentos sociais, pois, numa
sociedade com muitas desigualdades e com o Estado mostrando-se incapaz
de satisfazer as necessidades dos diferentes grupos sociais, podemos
afirmar que esses movimentos são quase que naturais "como a chuva". É
uma infinidade de grupos que lutam contra o preconceito, o racismo, o
desemprego, a falta de moradia, os salários rebaixados, o autoritarismo,
contra o descaso com o meio ambiente, com a criança, com o idoso, com a
educação, com a saúde, etc.
As necessidades são infinitas e é por
isso que existem os sem-terra, o movimento negro, o movimento de
mulheres, os movimentos contra a discriminação de gays e lésbicas, os
sindicatos, os grêmios estudantis, o movimento ecológico, o movimento
pelos direitos humanos, os partidos de esquerda e algumas ONGs.
Precisamos
ter clareza, tomar consciência de nossos direitos, identificar onde
estão os males sociais, para não utilizarmos nossa indignação contra
aqueles que, talvez, sejam tão vítimas quanto nós.
Por outro aldo,
devemos ver com os olhos críticos por que se fala tão mal de certos
movimentos sociais. Aqui, nosso olhar sociológico deve mais do que nunca
funcionar, pois devemos saber quem faz a crítica e que interesses tem
ao fazê-lo. Por exemplo: quando se faz uma crítica ao MST por "invadir"
terras, quem está fazendo esta crítica? Os empresários, os donos de
terras ou o trabalhador comum das cidades? Por fim, num mundo
neoliberal, qual seria a importância dos movimentos sociais e dos
partidos políticos?
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